Terreno de mais de 90 hectares fica localizado em frente ao Parque Gigante, na margem oposta do Rio Guaíba
O Ministério Público (MP) do Rio Grande do Sul recebeu na última quinta-feira (25) um pedido de abertura de investigação sobre a doação de um terreno na cidade de Guaíba para o Inter. O ofício, que aponta indícios de irregularidade na operação promovida pelo governo do Estado, foi entregue pelos deputados Fábio Ostermann e Giuseppe Riesgo, do Partido Novo. O objetivo do clube é construir, na cidade pertencente à região metropolitana de Porto Alegre, um novo Centro de Treinamentos, chamado de "Cidade do Inter". A área, de mais de 90 hectares, fica localizada em frente ao Parque Gigante, na margem oposta do Guaíba.
Segundo os deputados, o imóvel estava avaliado em R$ 16,6 milhões na proposta protocolada pelo Palácio Piratini. Porém, no último balanço contábil apresentado pela diretoria colorada, no final do ano passado, a área era estimada com o valor de R$ 56,9 milhões. Ou seja, R$ 40 milhões a mais do que apontou o Estado meses antes.
— Sem haver nem tempo para fazer nenhuma melhoria, houve uma valorização efetiva do terreno que nos chamou a atenção. Ou ele foi sobrevalorizado pela empresa contratada pelo Inter, ou subvalorizado pelo governo. E, neste caso, obviamente, diz respeito a recursos públicos do Estado do Rio Grande do Sul. Corremos o risco de ter votado a partir de informações equivocadas. Então, isso cria potencialmente um problema. Por isso, enviamos um ofício ao Ministério Público. Não queremos fazer nenhum juízo apressado, mas salta aos olhos esta diferença — argumentou Ostermann.
Para o deputado estadual, definir o valor correto é essencial para que as contrapartidas sejam justas:
— Não queremos favorecer ninguém. Poderíamos ter feito uma emenda para que o Internacional promovesse contrapartidas no valor integral, mas propomos em plenário que fosse feita uma contrapartida em 50% do valor. Porque achamos que o governo do Estado tem imóveis demais, e que a gente precisa ter um processo de alienação e privatização destes imóveis. Se o Inter tem interesse nisso aí, vamos facilitar, mas também não vamos dar dinheiro público de mãos beijadas.
De acordo com o vice-presidente de negócios estratégicos do Inter, João Pedro Lamana Paiva, a discussão em torno da cedência do terreno se iniciou ainda em 2014, sendo que o projeto foi aprovado pela Assembleia Legislativa apenas em novembro do ano passado. Na ocasião, ficou estabelecido que o Inter realizasse, em contrapartida, obras em escolas estaduais a um custo aproximado de R$ 3,3 milhões (20% do valor estimado da área cedida), além de executar um projeto de iluminação nas fachadas do Palácio Piratini e do Centro Administrativo Fernando Ferrari.
— Quando o Inter recebeu e escritura da área, a auditoria pediu para fazer uma avaliação. Isso é normal, é de contabilidade. Dos 92 hectares, 47 é área não edificante de preservação permanente, banhado. Então, na verdade, o Inter estaria usando 43 hectares só. Falta a regularização de dois. E, além disso, tem 43 figueiras que são imunes de corte dentro dessa área. De que adiantava ficar para o Estado isso? Uma área sem regularização, não vale nada. O Inter fez tudo em nome do Estado. Então, este é o sentido. Não existe absolutamente nada que possa macular qualquer espécie de detalhes que, por ventura, estejam surgindo — explicou o dirigente.
Ainda assim, Lamana Paiva revelou que não foi pego de surpresa com a denúncia, já que havia sido procurado pelo próprio deputado para esclarecer as diferenças nos valores apresentados.
— Este deputado (Fábio Ostermann) já causou um grande problema quando a Assembleia foi votar, porque existe um acordo. Em 2018, quando foi para se regularizar a área do co-irmão, em frente à Arena, o governador da época, que era o Sartori, o presidente do Grêmio e os deputados se reuniram e fizeram um acordo: "Nós vamos usar o mesmo critério para o Inter, por ocasião da regularização da área de Guaíba". Todos aceitaram. Quando entrou a área do Inter, no dia seguinte, este cidadão (Ostermann) entrou com emenda. Ao todo, foram oito emendas. É uma injustiça o que está sendo feito. Eles "grenalizaram", infelizmente. E quando se "grenaliza" qualquer atividade, não tem progresso. No caso do Fábio, que é gremista, ele está "grenalizando" e prejudicando não só o Estado, mas a cidade de Guaíba. Enfim, quando foi para votação, vencemos com apenas quatro votos contrários. Então, é um projeto perfeito, acabado, legal, sem qualquer tipo de maculação — exclamou o dirigente colorado.
Líder da bancada do Partido Novo, Ostermann rechaçou qualquer motivação futebolística. Segundo ele, desde que o assunto veio à tona, muitos torcedores colorados passaram a lhe hostilizar nas redes sociais.
— Nós reconhecemos a importância do Inter. O pessoal nos atacou, dizendo que somos clubistas, mas nossa bancada tem a curiosidade de ser formada por um colorado e um gremista. O Giuseppe (Riesgo) é colorado e sócio do Inter. Mas esta não é uma questão de torcida. Precisamos avançar neste debate, até por uma questão de maturidade — finalizou o deputado.
Procurado pela reportagem de GaúchaZH, o governo do Estado esclareceu, por meio de nota, que "a análise é feita a partir de uma série de quesitos técnicos, seguindo as normas da ABNT, registradas no Inmetro como NBR 14653" e reafirmou "absoluta segurança do processo de avaliação do valor do terreno e está à disposição para quaisquer esclarecimentos complementares".
Confira a nota divulgada pelo governo do Estado na íntegra:
"Em relação ao ofício encaminhado pela bancada do Partido Novo ao Ministério Público, solicitando investigação sobre a doação, por parte do Estado, de terreno ao Sport Club Internacional, o governo esclarece que:
- A avaliação do valor da área foi feita pelo Departamento de Administração do Patrimônio (Deape) da Secretaria Estadual de Planejamento, Orçamento e Gestão.
- A análise é feita a partir de uma série de quesitos técnicos, seguindo as normas da ABNT, registradas no INMETRO como NBR 14653. O laudo, com 45 páginas, é público e pode ser solicitado a qualquer momento. A conclusão dos técnicos do governo foi de que o terreno, à época da doação, valia R$ 16,6 milhões.
- O governo reafirma sua absoluta segurança do processo de avaliação do valor do terreno e está à disposição para quaisquer esclarecimentos complementares."
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