domingo, 7 de setembro de 2014

O STJD e a CBF vão combater o racismo no futebol?

Os jogadores do Grêmio antes da partida contra o Santos em que Aranha foi insultado (Foto: Lucas Uebel / Grêmio)
Os jogadores do Grêmio antes da partida contra o Santos em que Aranha foi insultado

Ricardo Graiche, um dos auditores do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) que condenou o Grêmio pelas injúrias racistas de sua torcida, compartilhou conteúdo preconceituoso no Facebook. A situação surreal, revelada pela Rádio Gaúcha, é só a pá de cal em mais uma decisão ilegítima do STJD, disfarçada de combate ao racismo no futebol. Cada vez mais, o tribunal tem ganhado protagonismo e imposto uma ordem seletiva e arbitrária capaz de piorar a já lamentável situação do futebol brasileiro.
Muita gente boa aprovou a decisão do STJD, como o colega Luiz Augusto Lima. Não faltam argumentos para tanto, uma vez que o Grêmio merecia ser punido e a pena coletiva, ao clube como um todo, é pedagógica. Em Porto Alegre, o goleiro do Santos, Aranha, foi submetido a alguns dos mais clamorosos insultos racistas na história recente do futebol. O clube gaúcho se mobilizou para buscar punições individuais, o que é obviamente necessário, mas alguns de seus dirigentes contemporizaram o espírito racista das injúrias, como contou o colega Bruno Winckler.
Ainda assim, é difícil defender a punição. Não só porque um dos auditores do STJD acha engraçado comparar a cor da pele de um bebê negro com refrigerante de cola, mas porque o tribunal como um todo é ilegítimo. Apesar do nome e do tratamento que recebe de parte da imprensa, o STJD não não passa de um tribunal de exceção. O STJD não está ligado ao Judiciário, mas é parte do complexo da CBF-Globo, o gerador primário de problemas no futebol brasileiro. O STJD, assim, age como advogado da confederação, protegendo e perseguindo determinados clubes conforme a possibilidade e o peso da cobertura da imprensa.
Em 2012, o Atlético-MG foi enquadrado pelo STJD após reclamar da arbitragem. No mesmo ano, diante de um clamor moralista e burro por conta de um gol de mão, o tribunal mudou a regra do futebol e prejudicou o Palmeiras. No ano passado, em defesa do Fluminense, o STJD rebaixou a Portuguesa. Agora, o tribunal volta a agir de forma seletiva. Como mostrou reportagem da Folha de S.Paulo, o caso envolvendo Aranha foi o 12º de racismo no futebol brasileiro em 2014. Nos outros, os culpados não apenas receberam penas mais leves que a do Grêmio como obtiveram um alívio delas ao recorrer ao STJD.
A punição ao Grêmio foi, também, duplamente conveniente para o complexo da CBF. Por um lado, o tribunal mostrou “força”, e fez isso em cima de um time virtualmente eliminado da competição de que foi excluído. Fez, também, em cima de determinados torcedores, claramente culpados, é verdade, mas sem direito à defesa, o que é grotesco, e cuja punição não será fiscalizada, como é óbvio. Ao mesmo tempo, a decisão joga a tarefa do combate ao racismo sobre os clubes, isentando a CBF de qualquer obrigação a respeito de ações que eduquem jogadores, torcedores e clubes sobre o tamanho do problema. Com a punição do Grêmio, passa-se a sensação de que “algo está sendo feito”, ainda que na verdade nada tenha mudado.
A forma ideal de contornar essa situação absurda seria derrubar toda a estrutura da CBF e, com ela, o STJD. Isso não vai ocorrer, no entanto, devido à falta de coesão, interesse e competência dos clubes. O resultado disso é que o combate ao racismo no futebol ganhou um “fato” puramente cosmético, e o futebol brasileiro, depois do rebaixamento da Portuguesa, ganhou mais uma tabela alterada pelo STJD. Não são boas notícias.

2 comentários:

Falando de História disse...

Parabéns pelo excelente texto.

Amaral Tricolor disse...

Fonte: http://esportefino.cartacapital.com.br/author/zelima82/