segunda-feira, 29 de junho de 2020

Doação de área do CT do Inter em Guaíba gera pedido de investigação no Ministério Público



Terreno de mais de 90 hectares fica localizado em frente ao Parque Gigante, na margem oposta do Rio Guaíba

O Ministério Público (MP) do Rio Grande do Sul recebeu na última quinta-feira (25) um pedido de abertura de investigação sobre a doação de um terreno na cidade de Guaíba para o Inter. O ofício, que aponta indícios de irregularidade na operação promovida pelo governo do Estado, foi entregue pelos deputados Fábio Ostermann e Giuseppe Riesgo, do Partido Novo. O objetivo do clube é construir, na cidade pertencente à região metropolitana de Porto Alegre, um novo Centro de Treinamentos, chamado de "Cidade do Inter". A área, de mais de 90 hectares, fica localizada em frente ao Parque Gigante, na margem oposta do Guaíba.

Segundo os deputados, o imóvel estava avaliado em R$ 16,6 milhões na proposta protocolada pelo Palácio Piratini. Porém, no último balanço contábil apresentado pela diretoria colorada, no final do ano passado, a área era estimada com o valor de R$ 56,9 milhões. Ou seja, R$ 40 milhões a mais do que apontou o Estado meses antes.

— Sem haver nem tempo para fazer nenhuma melhoria, houve uma valorização efetiva do terreno que nos chamou a atenção. Ou ele foi sobrevalorizado pela empresa contratada pelo Inter, ou subvalorizado pelo governo. E, neste caso, obviamente, diz respeito a recursos públicos do Estado do Rio Grande do Sul. Corremos o risco de ter votado a partir de informações equivocadas. Então, isso cria potencialmente um problema. Por isso, enviamos um ofício ao Ministério Público. Não queremos fazer nenhum juízo apressado, mas salta aos olhos esta diferença — argumentou Ostermann.

Para o deputado estadual, definir o valor correto é essencial para que as contrapartidas sejam justas:

 — Não queremos favorecer ninguém. Poderíamos ter feito uma emenda para que o Internacional promovesse contrapartidas no valor integral, mas propomos em plenário que fosse feita uma contrapartida em 50% do valor. Porque achamos que o governo do Estado tem imóveis demais, e que a gente precisa ter um processo de alienação e privatização destes imóveis. Se o Inter tem interesse nisso aí, vamos facilitar, mas também não vamos dar dinheiro público de mãos beijadas.

De acordo com o vice-presidente de negócios estratégicos do Inter, João Pedro Lamana Paiva, a discussão em torno da cedência do terreno se iniciou ainda em 2014, sendo que o projeto foi aprovado pela Assembleia Legislativa apenas em novembro do ano passado. Na ocasião, ficou estabelecido que o Inter realizasse, em contrapartida, obras em escolas estaduais a um custo aproximado de R$ 3,3 milhões (20% do valor estimado da área cedida), além de executar um projeto de iluminação nas fachadas do Palácio Piratini e do Centro Administrativo Fernando Ferrari.

— Quando o Inter recebeu e escritura da área, a auditoria pediu para fazer uma avaliação. Isso é normal, é de contabilidade. Dos 92 hectares, 47 é área não edificante de preservação permanente, banhado. Então, na verdade, o Inter estaria usando 43 hectares só. Falta a regularização de dois. E, além disso, tem 43 figueiras que são imunes de corte dentro dessa área. De que adiantava ficar para o Estado isso? Uma área sem regularização, não vale nada. O Inter fez tudo em nome do Estado. Então, este é o sentido. Não existe absolutamente nada que possa macular qualquer espécie de detalhes que, por ventura, estejam surgindo — explicou o dirigente.

Ainda assim, Lamana Paiva revelou que não foi pego de surpresa com a denúncia, já que havia sido procurado pelo próprio deputado para esclarecer as diferenças nos valores apresentados.

— Este deputado (Fábio Ostermann) já causou um grande problema quando a Assembleia foi votar, porque existe um acordo. Em 2018, quando foi para se regularizar a área do co-irmão, em frente à Arena, o governador da época, que era o Sartori, o presidente do Grêmio e os deputados se reuniram e fizeram um acordo: "Nós vamos usar o mesmo critério para o Inter, por ocasião da regularização da área de Guaíba". Todos aceitaram. Quando entrou a área do Inter, no dia seguinte, este cidadão (Ostermann) entrou com emenda. Ao todo, foram oito emendas. É uma injustiça o que está sendo feito. Eles "grenalizaram", infelizmente. E quando se "grenaliza" qualquer atividade, não tem progresso. No caso do Fábio, que é gremista, ele está "grenalizando" e prejudicando não só o Estado, mas a cidade de Guaíba. Enfim, quando foi para votação, vencemos com apenas quatro votos contrários. Então, é um projeto perfeito, acabado, legal, sem qualquer tipo de maculação — exclamou o dirigente colorado.

Líder da bancada do Partido Novo, Ostermann rechaçou qualquer motivação futebolística. Segundo ele, desde que o assunto veio à tona, muitos torcedores colorados passaram a lhe hostilizar nas redes sociais.

— Nós reconhecemos a importância do Inter. O pessoal nos atacou, dizendo que somos clubistas, mas nossa bancada tem a curiosidade de ser formada por um colorado e um gremista. O Giuseppe (Riesgo) é colorado e sócio do Inter. Mas esta não é uma questão de torcida. Precisamos avançar neste debate, até por uma questão de maturidade — finalizou o deputado.

Procurado pela reportagem de GaúchaZH, o governo do Estado esclareceu, por meio de nota, que "a análise é feita a partir de uma série de quesitos técnicos, seguindo as normas da ABNT, registradas no Inmetro como NBR 14653" e reafirmou "absoluta segurança do processo de avaliação do valor do terreno e está à disposição para quaisquer esclarecimentos complementares".

Confira a nota divulgada pelo governo do Estado na íntegra:

"Em relação ao ofício encaminhado pela bancada do Partido Novo ao Ministério Público, solicitando investigação sobre a doação, por parte do Estado, de terreno ao Sport Club Internacional, o governo esclarece que:

- A avaliação do valor da área foi feita pelo Departamento de Administração do Patrimônio (Deape) da Secretaria Estadual de Planejamento, Orçamento e Gestão.

- A análise é feita a partir de uma série de quesitos técnicos, seguindo as normas da ABNT, registradas no INMETRO como NBR 14653. O laudo, com 45 páginas, é público e pode ser solicitado a qualquer momento. A conclusão dos técnicos do governo foi de que o terreno, à época da doação, valia R$ 16,6 milhões.

- O governo reafirma sua absoluta segurança do processo de avaliação do valor do terreno e está à disposição para quaisquer esclarecimentos complementares."

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